terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Natal, Natal das crianças



Estava tão concentrado em sua leitura que nem reparou como o ônibus havia ficado cheio. Somente quando uma moça parou ao seu lado, acompanhada do filho, foi que ele “despertou”. O jovem levantou-se, educadamente, a fim de ceder seu lugar para que a moça sentasse com seu filho, que aparentava ter uns oito anos.
Em pé, o rapaz começou a abrir sua mochila para guardar o livro que estava lendo anteriormente, mas foi interrompido pelo menino:
- Está lendo o que, tio?
- Elogio da Loucura. Mas não me chama de tio... Tenho quase a sua idade.
- Tem nada! Eu só tenho 7 anos! – respondeu o menino, sorrindo. – Posso ver? – e pegou o livro.
- Daniel!! Que falta de educação! Devolve para o moço! – repreendeu a mãe.
- Não, tudo bem! Você gosta de ler, Daniel?
- Depende... – respondeu a criança enquanto abria o livro e passava as páginas.
- Ué, como assim “depende”? – divertiu-se o jovem.
- Depende, tio...
- Lucas. Me chama de Lucas, só para eu não me sentir muito velho, combinado? – e sorriu.
Aliás, se tinha uma coisa que Lucas não conseguia segurar perto das crianças era o sorriso. Era um fã declarado delas, da espontaneidade, da habilidade que elas têm de acreditar nas coisas.
- Beleza... – concordou Daniel – Então, esse aqui, por exemplo, eu não gostei, ti... Lucas!!
- Ah, não? Por quê? Você nem leu ainda, zé mané!
- Mas quase não tem travessão. Eu gosto quando tem muito travessão.
- Como assim?
- É! Gosto das conversas! É o mais importante em qualquer história.
Lucas ficou surpreso. Só conseguiu balançar a cabeça afirmativamente.
O garoto devolveu o livro e o rapaz guardou na mochila. Alguns minutos passaram até que Lucas notou o menino distraído com a decoração de Natal de uma loja. Aproveitou para puxar assunto novamente:
- Bonito, né? E de Natal, você gosta ou também “depende”? – falou imitando a entonação de Daniel.
- Ah, gosto! – disse o garoto sorrindo, mas ficou pensativo logo depois – Lucas, você acredita em Papai Noel?
O rapaz ficou sem saber como reagir à pergunta e olhou para a mãe. Ela, tão surpresa quanto Lucas, apenas deu de ombro. Para o alívio de ambos, Daniel voltou a falar:
- Eu não acredito, sabe? Já não sou mais criancinha...
- Ah, não é mais criancinha? – Lucas e a mãe do menino começaram a rir.
- Sou não. Sei que ele não existe. E vocês dois também sabem disso. Mas, se ele existisse e você pudesse pedir um presente para ele, o que você pediria, Lucas?
- Caramba! Assim, na lata? Sei lá! São muitas opções...
- Então, é fácil! Só escolhe uma das opções. Pode ser qualquer coisa! – disse Daniel revirando os olhos.
- Não sei, zé mané! É uma pergunta muito difícil!
- Para adultos é tudo muito difícil... – resmungou Daniel.
Lucas achou graça e melhor não retrucar, pois concordava plenamente com o menino. Entretanto, aquela pergunta ficou na cabeça dele. O que pediria para o Papai Noel? Demorou muito até encontrar uma resposta.
- Daniel... Pode ser qualquer coisa mesmo, né?
- Qualquer coisa o quê?
- O pedido pro Papai Noel, zé mané!
- Ah, tá! Pode! Pensou em alguma coisa?
- Sim. Se eu pudesse pedir qualquer coisa para o Papai Noel, eu pediria que minha mãe vivesse para sempre.
- E eu que sou o zé mané... – falou o menino, balançando a cabeça negativamente.
- Ué, você disse que poderia ser qualquer coisa!
- É, mas se sua mãe vivesse pra sempre, ela iria sofrer pra sempre depois que você morresse.
A resposta foi um choque para Lucas:
- Cara, você tem certeza que só tem 7 anos? – divertiu-se o rapaz.
- Viu? Eu disse que não era mais criancinha!
Neste momento, a mãe de Daniel se levantou e disse:
- Vamos, Dani. Se despede do Lucas porque a gente desce no próximo ponto.
O garoto apertou a mão de Lucas e deu tchau. Enquanto mãe e filho se dirigiam para a parte de trás do ônibus, Lucas chamou o rapazinho:
- Daniel! – o menino virou-se para olhar – E você? O que pediria para o Papai Noel?
Daniel olhou para o chão no ônibus durante poucos segundos e, depois que este parou, respondeu enquanto descia:
- Travessões... Muitos travessões na vida de todo mundo.

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